quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Enquanto isso, no todo-poderoso STF...

Duas importantes pendências mobilizam o Supremo Tribunal Federal: a permissão para aborto de anencéfalos e a demarcação da reserva indígena Raposa/Serra do Sol. A primeira ainda está em fase de audiências e dará ensejo a muito bate-boca obscurantista. Também a questão da reserva deverá sofrer os atrasos protocolares de sempre, mas possui mais premência e potencial explosivo.
A idade me fez desconfiado de certos purismos preservacionistas e isolacionistas que às vezes transformam as causas ambientais e indígenas em bandeiras dogmáticas intocáveis. Não sei (repito: não sei) se ainda há justificativa plausível para manter algumas centenas de nativos em extensos territórios inexplorados. Dói fazer esta pergunta (dói mais sentir remorsos por fazê-la), mas até que ponto a política ultraprotetora é benéfica para o país, para a cultura, para os próprios índios?
Feitas essas ponderações pecaminosas, cabe afirmar que a discussão no STF é mais simples do que parece. A constitucionalidade claramente embasa a demarcação, decidida pelo governo FHC e implementada por Lula. Há questionamentos técnicos e administrativos possíveis, que, porém, ultrapassam o âmbito do Tribunal.
O problema é que a situação no Estado cheira a conflito aberto. Há um clima de animosidade latente, alimentado pelo banditismo generalizado, pela ruptura institucional e por conflitos entre o Exército e a Polícia Federal. Em minutos, graças a um mal-entendido ou à insensatez de um comandante imbecil, cria-se uma chacina. Conhecendo a situação, o STF optará por uma saída intermediária, nem tanto presa à legalidade estrita quanto a apaziguamentos políticos.
E lá vai o Tribunal legislar sem mandato, de novo. Os nobres ministros farão seus discursos pomposos, com as impostações e caretas dos grandes heróis históricos, propondo regulamentações indevidas que ferem suas atribuições funcionais e, no limite, servem para nada. E a imprensa babona tratá-los-á como os messias da Justiça super-humana, o Poder entre os Poderes, os conciliadores divinos.

É possível entender melhor a questão e acompanhar os trabalhos no STF na página Socioambiental. Um bom argumento contrário à demarcação está no blog do Alon.

4 comentários:

Anônimo disse...

Amigo guilherme,a pergunta que faz à consciência é se a demarcação das terras indígenas é útil ao "país", mas de que país tá falando? Lembro do FHC e do Lula, como se utilizam dessa palavra para justificar políticas públicas e tomadas de decisões. Mas de qual país estão falando? Notou que é raro escapar dos presidentes a palavra "povo"? E do mais notório integrante do "partido dos trabalhadores" a palavra "trabalhador"? "Territórios inexplorados", entendi, para os capitalistas explorarem e dizimarem o que resta dos índios em nome dos seus lucros, no caso, os arrozeiros?Para a cultura? Cultura do homem branco? Não interessa preservar a cultura indigena? Não interessa a quem? O índio precisa aprender a viver como o branco? Será? Quem ensina quem a viver com dignidade e respeito ao ser humano?Aqui, de muito longe, acho que o índio que é distância do branco e da sua civilização.Abração! João Antonio

João Gabriel Rodrigues disse...

Concordo em vários pontos do comentário do meu xará acima, mas, enfim...

Excelente blog!

Um abraço.

J.Eduardo R. de C disse...

Caro Guilherme!
Não são apenas "algumas centenas" de índios como diz! São 19.000 índios de 5 etnias que moram na área em 194 comunidades! E são apenas 6 as famílias de arrozeiros latifundiários que querem ou enxotar os índios ou simplesmente transformá-los em mão-de-obra semi-escrava! E mais: não são áreas "inexploradas" como diz. Porque os índios as conhecem muito bem! E muito aprenderiam os brancos se tivessem a humildade de conhecer o modo como os índios exploram uma floresta sem destruí-la. Daí porque o conhecimento das culturas autóctones é de vital importância para todos. Porque o próprio futuro da humanidade está em jogo.
Um abraço!

Unknown disse...

Como ressaltei, tenho dúvidas sobre tudo isso. O discurso é interessante, mas a problemática real me parece menos bipolar ou simplista. O importante é que haja um debate permanente, aberto à multiplicidade de abordagens, principalmente as mais inovadoras.
Para tanto, a participação de todos é sempre muito bem-vinda. Abraços do
Guilherme