Diante de eventos ou obras discutíveis financiados
com verba pública, o contribuinte esbraveja: “não com o meu dinheiro!” Sem
jamais discutir o mérito do desabafo, questiono se faz alguma diferença que a
origem imediata do investimento seja um órgão estatal ou uma empresa
particular. Pois de alguma forma também não é o “nosso dinheiro” que sustenta
os patrocínios bancados com os produtos que consumimos?
O nível de ingerência do cidadão isolado é
similar, e igualmente mínimo, sobre ambas as categorias de financiamento. A teórica
legitimidade da escolha popular corrobora tanto o político perdulário quanto a
empresa que vomita mentiras em horário nobre ou ajuda a sustentar, por exemplo,
o manipulado campeonato brasileiro de futebol. No ambiente cartelizado em que
vivemos, as decisões de compra revelam-se tão livres quanto as do eleitor que
muda seu voto achando que assim pagará menos tributos.
No final das contas (trocadilho inevitável), esse
mecanismo de ilusões autonomistas funciona através das mesmas engrenagens,
lubrificadas com tonéis de propaganda enganosa. Nenhum veículo informativo denunciará
as empresas que o sustentam. Nenhum parlamentar correrá o risco de perder os
financiadores de suas campanhas. E, claro, ninguém deixará de usar o plano de
saúde só porque ele faz lobbies no Congresso ou o remédio porque seu
laboratório paga viagens para os médicos.
A inação generalizada não é fortuita. A falácia da
democracia representativa tem sua mais completa e acessível evidência no
sistemático desrespeito ao consumidor. Quando tolera os abusos perpetrados nos
escambos cotidianos, o cidadão já anuncia o tipo de atitude política que ajuda
a máquina a operar impunemente.
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