quarta-feira, 24 de março de 2010

“Santuário”


William Faulkner (1897-1962) escreveu-o aos 34 anos. O personagem Popeye tem as características físicas do escritor: franzino, pequeno bigode, roupas impecáveis, cigarro nos dedos, um ar desencantado perante o mundo. A primeira surpresa com o escritor, que eu não conhecia, é a extrema desolação de seus cenários (o sul estadunidense, na década de trinta), a ruína moral dos desvalidos que tentam sobreviver à crise econômica, a violência extrema da narrativa. E, ao mesmo tempo, como toda essa tragédia nasce de um estilo tão impecavelmente vigoroso, com imagens precisas e cadências perfeitas. Faulkner é difícil, pessimista, cruel. Mas tudo isso com maestria inigualável.

Os dois primeiros parágrafos

“Por detrás do biombo formado pelas moitas que cercavam a nascente, Popeye observava o homem que bebia. Mal definida trilha levava da estrada à fonte. Popeye vira o homem – sujeito alto, magro, sem chapéu, metido em surradas calças de flanela cinza e tendo no braço o paletó de tweed – emergir da trilha e ajoelhar-se para beber.

Na raiz de uma faia brotava a nascente, correndo sobre leito ondeantemente arenoso. Cercava-a densa vegetação de juncos, sarças e ciprestes, onde se viam isoladas manchas de luz que não pareciam ter ligação com o sol. Ouviu-se, nalgum ponto, o canto de um pássaro – pássaro oculto, misterioso e, no entanto, bem próximo. Três notas; depois, silêncio”.
Da série "Todo prosa".

2 comentários:

Anônimo disse...

Adorei as imagens e os sons.
Numa subjetividade insípida, bebí dois primeiros parágrafos num gole só .Foi mais do que sede , verde e barulho .
Mas quem será que bebia ?

Galerius disse...

Eu não conheço Faulkner. Tentei lê-lo mas não me agradou, não tive paciência e do mesmo modo ocorreu com relação a Updike, Tom Wolf, e também com o pai de santo Hemingway que escrevia como um jornalista que escreve e escreve e não diz nada - e ele era jornalista de fato - e tambem aquele hipócrita de tanta fama, o Norman Mailer, e o resto que fazem as manchetes. Da literatura americana, que é riquíssima, eu prefiro John Steinbeck que foi uma grande figura e um homem de grande humanidade. E para quem sabe ler inglês, o Mark Twain por ter sido não somente um intelectual de primeiríssima mas por seu uso extraordinário da lingua inglesa, um escritor pouco reconhecido, e muito trivializado pelas cabeças ocas, mas de uma classe olímpica.