Publicado no Observatório da Imprensa (ilustração de Murilo Silva).
Foram exatos dez anos de colaboração ininterrupta com a Caros Amigos. Cento e vinte artigos depois, a aventura terminou. A iniciativa partiu da Redação, empenhada numa reforma que diminuiu as colunas opinativas em proveito de novos espaços para ilustrações, entrevistas, perfis e reportagens. Apesar da tristeza, apóio as mudanças e aceito o fim necessário dessa fase muito produtiva e enriquecedora.
Orgulhoso de ter sido um dos mais duradouros articulistas da Caros Amigos e seu leitor fiel desde o início (ainda preservo todos os números), enviei ao diretor Wagner Nabuco alguns comentários visando contribuir para o futuro do projeto. Neles sugeri revisões mais criteriosas, prudência no uso de coloquialismos, cuidados nas abordagens técnicas e nas entrevistas, maior apuro no tratamento das imagens e um desenho gráfico mais ousado e chamativo, que destoe do estilo conservador de muitas publicações de esquerda.
Faltou uma reflexão sobre a linha editorial, que esboço agora.
Tomemos o primeiro exemplar, de abril de 1997. Além do entrevistado Juca Kfouri, o time de colaboradores incluía Luis Fernando Veríssimo, Matthew Shirts, Mário Prata, Gabriel Priolli, Plínio Marcos, Emiliano José, Júlio Medaglia, Jaguar, Ricardo Kotscho, Ignácio de Loyola Brandão, Gabriel Garcia Marquez e várias outras celebridades. Embora fosse razoável questionar os motivos do sumiço quase completo daqueles parceiros, evitemos interpretá-lo como sintoma de uma hipotética decadência qualitativa. E ela não ocorreu, com efeito, porque a publicação conseguiu preservar a heterogeneidade e o espírito polemista da equipe inaugural.
Desde a morte de Sérgio de Souza, seu heróico fundador, a Caros Amigos viveu algumas inevitáveis transformações gerenciais, que levaram a sutis rearranjos dos pendores ideológicos predominantes na Redação. Embora tenha convivido serenamente com a maioria das mudanças, uma em particular foi me deixando ressabiado nos últimos tempos: o gradativo alinhamento das análises políticas a certas convicções radicais de esquerda, perceptíveis nos discursos meio coringas, anti-tudo, que reduzem os assuntos mais complexos à lógica das utopias revolucionárias.
Não generalizo a crítica, e tampouco pretendo alimentar disputas individuais. Aliás, sempre defenderei a pertinência daqueles enfoques radicalizados. Mas julgo necessário submetê-los a visões diversas, que permitam ao leitor instruir-se e formular sua própria interpretação dos fatos. Do contrário, teremos apenas uma versão contestadora do indesejável pensamento único.
A decisão de fortalecer a reportagem e o depoimento pode conferir relevância e utilidade pública à revista. Para tanto, é realmente necessário limitar os espaços reflexivos. Mas destiná-los sempre aos mesmos pontos-de-vista leva à repetição estéril, deixando a publicação previsível e, pior, limitada a facções minoritárias do múltiplo espectro do pensamento progressista. Um rodízio no elenco de colaboradores mensais ou a promoção de debates sobre temas específicos tornariam a leitura dinâmica e instigante, e evitariam que o veículo fique estigmatizado como vitrine de determinados movimentos reivindicatórios, dissidências partidárias e nichos corporativistas.
A única estratégia viável de fortalecimento dos periódicos alternativos é sair do gueto, somar esforços e diferenciar-se da monotonia reinante, fornecendo ao público um leque de vozes multidisciplinares, dispostas ao debate plural. “Sem partidarismo, sem vanguardismo, sem voluntarismo, na verdade, sem nenhum ismo”, como defendia Serjão no lançamento da Caros Amigos.
Orgulhoso de ter sido um dos mais duradouros articulistas da Caros Amigos e seu leitor fiel desde o início (ainda preservo todos os números), enviei ao diretor Wagner Nabuco alguns comentários visando contribuir para o futuro do projeto. Neles sugeri revisões mais criteriosas, prudência no uso de coloquialismos, cuidados nas abordagens técnicas e nas entrevistas, maior apuro no tratamento das imagens e um desenho gráfico mais ousado e chamativo, que destoe do estilo conservador de muitas publicações de esquerda.
Faltou uma reflexão sobre a linha editorial, que esboço agora.
Tomemos o primeiro exemplar, de abril de 1997. Além do entrevistado Juca Kfouri, o time de colaboradores incluía Luis Fernando Veríssimo, Matthew Shirts, Mário Prata, Gabriel Priolli, Plínio Marcos, Emiliano José, Júlio Medaglia, Jaguar, Ricardo Kotscho, Ignácio de Loyola Brandão, Gabriel Garcia Marquez e várias outras celebridades. Embora fosse razoável questionar os motivos do sumiço quase completo daqueles parceiros, evitemos interpretá-lo como sintoma de uma hipotética decadência qualitativa. E ela não ocorreu, com efeito, porque a publicação conseguiu preservar a heterogeneidade e o espírito polemista da equipe inaugural.
Desde a morte de Sérgio de Souza, seu heróico fundador, a Caros Amigos viveu algumas inevitáveis transformações gerenciais, que levaram a sutis rearranjos dos pendores ideológicos predominantes na Redação. Embora tenha convivido serenamente com a maioria das mudanças, uma em particular foi me deixando ressabiado nos últimos tempos: o gradativo alinhamento das análises políticas a certas convicções radicais de esquerda, perceptíveis nos discursos meio coringas, anti-tudo, que reduzem os assuntos mais complexos à lógica das utopias revolucionárias.
Não generalizo a crítica, e tampouco pretendo alimentar disputas individuais. Aliás, sempre defenderei a pertinência daqueles enfoques radicalizados. Mas julgo necessário submetê-los a visões diversas, que permitam ao leitor instruir-se e formular sua própria interpretação dos fatos. Do contrário, teremos apenas uma versão contestadora do indesejável pensamento único.
A decisão de fortalecer a reportagem e o depoimento pode conferir relevância e utilidade pública à revista. Para tanto, é realmente necessário limitar os espaços reflexivos. Mas destiná-los sempre aos mesmos pontos-de-vista leva à repetição estéril, deixando a publicação previsível e, pior, limitada a facções minoritárias do múltiplo espectro do pensamento progressista. Um rodízio no elenco de colaboradores mensais ou a promoção de debates sobre temas específicos tornariam a leitura dinâmica e instigante, e evitariam que o veículo fique estigmatizado como vitrine de determinados movimentos reivindicatórios, dissidências partidárias e nichos corporativistas.
A única estratégia viável de fortalecimento dos periódicos alternativos é sair do gueto, somar esforços e diferenciar-se da monotonia reinante, fornecendo ao público um leque de vozes multidisciplinares, dispostas ao debate plural. “Sem partidarismo, sem vanguardismo, sem voluntarismo, na verdade, sem nenhum ismo”, como defendia Serjão no lançamento da Caros Amigos.
4 comentários:
Muito boa a sua análise,Guilherme.
Abraço de um também ex-colaborador da Caros Amigos,
Cesar Cardoso
Fui assinante por quase 8 anos. Depois do falecimento de Sérgio de Souza notei que a publicação perdeu o ímpeto. Seguiram-se várias baixas na equipe de colaboradores e o conteúdo passou a não me entusiasmar como antes. De quem partiu a idéia de oferecer ao senador Suplicy espaço na revista? Como se já não bastasse sua pífia atuação parlamentar.
eu sempre admiro a sua tranquilidade ao analisar os temais mais complexos ou espinhosos, ainda que te envolvam pessoalmente. sou absolutamente admirador do teu trabalho.
uma dica: para a formaçao dos leitores q não tem oportunidade d cursarem uma faculdade, talvez vc pudesse sugerir algumas leituras bem geralzão mesmo meio em ordem cronológica - primeiro esse, dpois aquele - para possibilitar talvez a construção de um conhecimento organizado. gosto muito d ler, mas leio d tudo um pouco e fica pouco sistemático aquilo que leio ....
sou seu fã, continue sempre na luta! vc tem discípulos....
abraço guilherme
diel26, muito obrigado pelo comentário lisonjeiro e pela ótima sugestão. Vou tentar esquematizá-la, de acordo com os assuntos abordados, na medida do possível. Alguma coisa nesse sentido já pode ser pesquisada na seção "literatura" do blog. Participe sempre, ok?
Um abraço do
Guilherme
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