segunda-feira, 16 de abril de 2012

A lei e a Constituição



Desenho de M. C. Escher

Só o fanatismo sádico justificaria a criminalização do aborto de anencéfalos. O prazo que o Supremo Tribunal Federal custou para admitir algo tão evidente dá uma idéia do caminho a ser percorrido pelo país até conquistar outras evoluções jurídicas necessárias. Mas a decisão histórica da Corte deixou algumas razões para otimismo.

Retirados de contexto, quer dizer, tomados pelo cerne doutrinário absoluto, os votos proferidos pelos ministros foram unânimes em admitir que existem limites para a intervenção do Estado em decisões de foro íntimo ligadas ao corpo, especialmente aquelas que podem evitar sofrimentos desnecessários ao indivíduo. Transportadas para outras esferas sob a alçada do STF (inclusive pendências que ainda aguardam seu julgamento), as declarações gerariam diversos avanços descriminalizadores, do uso de drogas à eutanásia, das pesquisas com células-tronco à própria interrupção da gravidez.

No cerne de todas essas discussões está o caráter laico do Estado de Direito e a essência racionalista, científica, do sistema legislativo. Se ficasse restrito ao mérito da questão e às suas modulações subjetivas, o STF teria confirmado o texto legal, que permite a interrupção da gravidez apenas em casos alheios à vontade da gestante. Reconhecendo que o direito reprodutivo possui alicerces constitucionais que escapam à própria legislação, o tribunal admitiu um precedente futuro para muitos questionamentos da mesma natureza.

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