segunda-feira, 18 de junho de 2012

No fundo era aquilo mesmo


Desconfio da tese de que as acusações de Gilmar Mendes a Lula teriam nascido num rompante boquirroto e impensado. Essa versão é demasiado confortável para o ministro, pois ameniza a gravidade dos seus pronunciamentos públicos anteriores. Também não vejo a hipotética necessidade dele inventar um motivo para se declarar impedido no julgamento do “mensalão”. Isso qualquer cidadão sensato já intuiu desde o começo.

A camada superficial e mais evidente das manobras da mídia corporativa não pode ser ignorada apenas porque simples e previsível. Desmoralizar a CPI do Cachoeira e dar-lhe aparência de conluio criminoso é uma forma eficaz de embaralhar a repercussão geral sobre o único mote razoavelmente unificado das investigações: os supostos elos entre a contravenção organizada, o Congresso (Demóstenes Torres), a grande imprensa (revista Veja) e o Judiciário (o próprio Mendes, Roberto Gurgel, Tourinho Neto). Diante do enorme investimento de propaganda pré-eleitoral conservadora que está prestes a desmoronar, o agressivo desespero da reação até faz sentido.

Mas o factóide carregava outra motivação nociva. Alimentando a radicalização política, Veja e Mendes quiseram contaminar o STF com estímulos alheios à abordagem técnica do tema. Sabemos há tempos que o relatório da Polícia Federal, a principal investigação que embasa o julgamento, é inconclusivo quanto à responsabilidade dos líderes petistas mais graúdos. O documento coloca dúvidas também acerca do caráter “organizado” e sistemático dos supostos delitos. O STF não tem obrigação de se restringir a esse material, mas o pendor subjetivo dos ministros influenciaria os votos numa direção que o próprio relatório se absteve de seguir.

De qualquer maneira, a pressão externa já fez o seu estrago e tornou-se irreversível. Ela só poderá ser contrariada caso os magistrados queiram deixar um gesto de repúdio ao colega de tribunal, ou, numa hipótese menos provável, se aparecer algum fato novo bombástico o suficiente para sensibilizá-los. Mesmo que houvesse vontade política, entretanto, à CPI faltariam prazos e recursos para atingir algum poder de influência na corte antes do início da votação.

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