Subproduto do marketing da crise irremediável, a
lacuna de um pacificador nacional moldou a narrativa midiática em torno de
Michel Temer. Sábio, moderado, arguto negociador, sua imagem foi sendo lapidada
para atender às exigências da conspiração desde que o impeachment virou uma
espécie de campanha eleitoral indireta.
O primeiro gesto da candidatura foi a carta a
Dilma Rousseff, que visou fazer do peemedebista a vítima inocente de um governo
que ele sugou o quanto pôde. Incapaz de se apresentar como alternativa, a
oposição buscava o testa de ferro (ironia máxima) no seio do próprio
governismo. Mas era necessário descolar um do outro.
O segundo ato surgiu no discurso vitorioso
antecipando a posse como presidente. Na sua “carta de intenções”, Temer reforçava
aquele personagem aglutinador e ponderado que traria de volta a
governabilidade. Um personagem acima de tudo poderoso, capaz de cumprir os
compromissos firmados na Câmara.
Ambas as peças retóricas compartilharam o estilo
cínico e ardiloso de divulgá-las, em vazamentos oportunistas, feitos através da
mídia corporativa. Elas também evidenciam que a participação de Temer no golpe foi
antiga, calculada e direta, desautorizando as versões de que teria apenas
atendido ao chamado da oposição.
Agora surge a exposição machista de sua esposa, contrapondo
a personalidade forte de Dilma e aproximando Temer do eleitorado conservador.
Dizem que a reportagem de Veja parece dos anos 1950, mas é erro de cronologia:
ela pertence mesmo a 1964.
Essa nova etapa do movimento propagandístico
destina-se a melhorar a baixíssima aprovação popular de Temer e a reverter a
sensação de que a Lava Jato virará uma enorme pizza judicial. No embalo, atrair
o PSDB reticente e envolver os senadores no clima de fato consumado.
As tais “pontes para o futuro” do programa
peemedebista apenas dissimulam a verdadeira disputa em jogo. Golpes, por
definição, dispensam plataformas. O futuro imediato do projeto Temer Presidente
exige dissipar a sombra de inconfiabilidade que paira sobre ele desde a
repugnante traição política que viabilizou o processo do impeachment.
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