A direita exagera seu triunfo nas disputas
municipais. Observando os mapas históricos, notamos dois fatores: a) jamais
houve “onda vermelha” nessa esfera, desautorizando a hipótese da “onda”
contrária; b) o resultado atual configura um rearranjo partidário de vitoriosos
no mesmo campo ideológico tradicionalmente hegemônico.
Em outras palavras, confirmou-se o antigo
predomínio regional da centro-direita, com pequena variação positiva. No quadro
geral, só a perda acentuada de votos do PT se destaca pontualmente. Ela pode refletir
menos um fortalecimento do PSDB do que o avanço das legendas pequenas que
nasceram depois de 2012 (SD, PROS, PEN, etc.).
A derrota do PT foi mais notável nos grandes
centros urbanos, palcos do imenso esforço propagandístico e financeiro das passeatas pelo impeachment. Ao mesmo tempo, o volume de votos inválidos (quase
um terço do eleitorado) e a ascensão de candidatos sem experiência partidária
sugerem que parte do antipetismo adquiriu uma face “antipolítica” apenas
circunstancialmente ligada às rivalidades usuais.
De qualquer forma, é impossível estabelecer
conexões causais de resultados em escopo tão vasto e complexo. Os arranjos das coligações,
a influência de governadores e o fisiologismo do governo ilegítimo (que negociou
o golpe com os interesses eleitorais dos
parlamentares) suplantam qualquer diagnóstico generalizante.
Cada processo eleitoral tem lógicas próprias que
não podem ser ignoradas. Cito o exemplo de São Paulo, que tem servido
erroneamente de modelo para abordagens conjunturais amplas. Ali, os seguintes
aspectos precisam ser considerados:
- Tempo de rádio e TV: João Doria montou extensa
coligação partidária, que resultou em maior exposição midiática e ampliou seu
índice de reconhecimento.
- Dinheiro: graças às novas regras eleitorais, a
riqueza pessoal de Doria deu-lhe enorme vantagem diante da falta de recursos de
Fernando Haddad.
- Comunicação: Doria explorou um perfil alinhado
ao ceticismo político do eleitor. Haddad chegou fragilizado pela sistemática
propaganda negativa da imprensa paulistana, além de ter feito um governo com promoção
institucional muito ruim.
- Estratégia: enquanto Haddad lutava para se
garantir no segundo turno, Doria (com auxílio dos institutos de pesquisa)
priorizou o arremate da disputa no primeiro.
- Arco de candidaturas: nas periferias, Doria se
beneficiou com o desgaste mútuo de nomes fortes nessas regiões; no “centro
expandido”, com o antipetismo militante das classes médias.
Por fim, parece urgente um debate sério acerca da
proibição de financiamento empresarial de campanhas. A individualização do
caixa dois e o favorecimento de candidatos com maior patrimônio são duas
consequências da canetada que trazem um preocupante viés antidemocrático ao
processo eleitoral.
Talvez esse tema entre nas pautas midiáticas,
assim que decantar o cinismo festivo dos analistas.
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