Nos primeiros minutos de 5 de junho de 1968, após discursar no salão do hotel Ambassador, em Los Angeles, o senador Robert Kennedy tentou atravessar a cozinha, em meio a uma multidão de seguidores, hóspedes e funcionários. O jovem jordaniano Sirhan Sirhan surgiu da aglomeração e disparou várias vezes, acertando o senador e cinco outras pessoas. Kennedy recebeu três tiros, um dos quais na cabeça, e faleceu no dia seguinte. As demais vítimas sobreviveram.
“Bobby” (2006) é o quarto filme escrito e dirigido por Emílio Estevez, astro juvenil dos anos 80. Enfoca os personagens que viriam a testemunhar o atentado, narrando suas histórias paralelas durante as horas antecedentes. Quase tudo é ficção, entremeada por imagens documentais de Kennedy e daquele período atribulado da história dos EUA. A tentativa de recriar um painel da sociedade estadunidense possui evidente influência do mestre Robert Altman e, se não o iguala, atinge excelentes resultados técnicos. Laurence Fishburne, Heather Graham, Anthony Hopkins, Helen Hunt, Lindsay Lohan, William Macy, Sharon Stone, Demi Moore, Elijah Wood, Christian Slater, Harry Belafonte, Martin Sheen, Ashton Kutcher e Estevez compõem o inacreditável elenco de estrelas unidas pelo texto inspirado e por uma boa causa.
Trata-se de um tributo a Kennedy e ao imaginário político do Partido Democrata sob o controle da trágica e emblemática família. A sagração épica dessa ideologia algo passadista enfraquece o filme, embora explique o empenho de tantos astros para conferir dignidade a um complicado projeto pessoal.
Há algo de estranhamente atual nesse enredo. Kennedy acabara de vencer as primárias na Califórnia e certamente seria o candidato democrata à Presidência naquele ano, com grandes chances de vitória. Os EUA afundavam numa guerra catastrófica, na crise econômica e em graves problemas sociais. Os democratas pareciam professar mudanças. Entretanto, sob o discurso inevitável das igualdades universais e do pacifismo, restava a figura messiânica do libertário nascido na elite mais selecionada, o independente fabricado nas engrenagens do poder, o demiurgo que precisa negar suas origens para combater a herança deixada pela própria família.
Uma pequena imagem documental ilustra à perfeição esse paradoxo tão característico do repertório democrata: Kennedy se aproxima de um militante negro e, com sorriso benevolente, lhe dá alguns tapinhas no rosto. Quase como se o afagasse, amansando-o.
2 comentários:
Valeu Guilherme, vc tem um bom gosto pra filmes.Sempre venho no seu blog, gosto dos textos q vc escreve. Lobby antimaconha foi perfeito. Sou estudante de Jornalismo aqui em São Luís-Ma. sempre gosto quando vc questiona o discurso da mídia. visito sempre seu blog...Prazer...Eduardo Lindoso
Olá, Eduardo, seja bem-vindo. Participe sempre.
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