Aos 50 anos, o chinês Wong Kar-Wai é tido como uma das mais promissoras revelações do cinema terráqueo. Ele de fato possui uma “assinatura” visual, suficientemente apurada e característica para afirmá-lo como autor. Mas há quem considere suas estilizações artificiais, posadas e solenes em demasia.
Kar-Wai está diferente nesta primeira incursão hollywodiana. A montagem e o movimento interno das cenas receberam uma agilidade nova, com tomadas em planos aproximados e câmera móvel – quase o oposto do distanciamento de “Amor à flor da pele” (2000), que remetia aos planos estáticos do mestre japonês Yazujiro Ozu.
Mas, em “Beijo”, a grande novidade, infelizmente negativa, é a verborragia. A leitura em off dos cartões postais escritos pela protagonista proporciona uma torrente de tiradas líricas na linha “a vida é uma sucessão de portas”. O recurso, desgastado, acarreta uma profusão de explicações sobre a profundidade das coisas que termina apenas pretensioso e, enfim, com o perdão da palavra, chato. Retire-se toda e qualquer narração em off, com exatamente as mesmas cenas (realmente não importa o que eles estão escrevendo, somos perfeitamente capazes de imaginá-lo) e teríamos um ótimo drama romântico, cheio das lacunas, dos silêncios e das dúvidas que tão bem fizeram aos filmes anteriores do diretor.
Norah Jones corresponde, considerando a péssima herança dramática dos músicos que se arriscam no cinema. E ela tem carisma, formando um par romântico harmonioso com Jude Law. Entre as estrelas que contribuem com pequenos papéis destaca-se David Strathairn (de “Boa noite, boa sorte”), magnífico no papel de um policial alcoólatra.
O filme se destaca pela direção de Kar-Wai, sensível e enxuta, valorizada, como sempre, pela belíssima direção de arte. É um bom filme de estrada (“road movie”), com o estranhamento típico dos diretores estrangeiros trabalhando em solo estadunidense. Um pouco mais de maturidade, um tanto menos de palavrório, e Kar-Wai ficará muito parecido com Wim Wenders. Parecido, apenas.
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