quarta-feira, 28 de maio de 2008

A demissão de Marina Silva

A prudência recomenda evitar a onda de beatificação da ex-ministra Marina Silva. A mesma imprensa que ignorou suas conquistas hoje as incensa para forrar de pregos o assento de Carlos Minc. Até semanas atrás, a gestão ambiental brasileira era tratada como motivo de vergonha perante a comunidade internacional. Agora vemos que não devíamos exigir a demissão da responsável pela área, mas mantê-la, trocando todo o restante do governo.
A condescendência da mídia, idealizando suas origens humildes (Lula não desfruta da mesma generosidade), reproduz os preconceitos do infame fazendeiro que chamou Marina de “indiazinha doente”. Ela é a Heloísa Helena do momento: dissidente bem-intencionada do governo dos pilantras, afagada por comentaristas que a ridicularizam pelas costas.
Há muito oportunismo nessa politização do discurso ecológico. O catastrofismo messiânico serve para isentar os verdadeiros destruidores da natureza, que há décadas financiam parlamentares e governantes das regiões atingidas. Não por acaso, a bandeira ambientalista vem sendo constantemente apropriada por forças conservadoras, proporcionando-lhes um confortável carimbo progressista – a glorificação de Al Gore e as filiações e alianças do Partido Verde brasileiro falam por si sós.
Uma crítica séria ao preservacionismo dispensa ponderações sobre a importância de suas plataformas. Ninguém precisa fazer média com a ilibada reputação de Marina Silva para afirmar que sua demissão também reflete, entre outras coisas, incapacidade político-administrativa. Tampouco é o caso de martirizá-la.
Marina viveu cercada por pressões de grupos que sobrevivem do combate cego à manipulação da natureza, mesmo quando se trata de aprimorar a vivência humana com projetos infra-estruturais legitimados pelas urnas. Ministérios não possuem vida própria. Eles existem para compor um programa administrativo abrangente, não para obstruí-lo, atrasando empreendimentos urgentes com justificativas dogmáticas.
A questão continua mergulhada num limbo opinativo de pendores futebolísticos. Ninguém quer discutir a viabilidade da cartilha ambientalista num contexto de necessidades generalizadas e riquezas naturais subutilizadas. Mais fácil e conveniente é alimentar o fundamentalismo caricato, anti-social e obsoleto, que depende da existência de inimigos imaginários para justificar a própria e que, portanto, evita aniquilá-los.
Não precisaria muito para identificar os criminosos de carne, osso e CNPJ escondidos sob a mitologia do Branco Malvado, dos Usineiros Demoníacos e das Represas do Apocalipse. Mas então seríamos obrigados a enfrentar jagunços armados, expulsar ONGs "amigas" e processar empresários, deputados, senadores, governadores, prefeitos, vereadores, juízes e funcionários federais. "Ai, que preguiça", murmuram os Macunaímas.
A pretensa modernidade do discurso preservacionista concede-nos o espetáculo dos bispos suicidas, dos índios que agridem engenheiros a golpes de facão, do separatismo amazônico e das ameaças de intervenção estrangeira em território soberano. A ignorância e a hipocrisia são venenos devastadores.

3 comentários:

Anônimo disse...

Olá, Guilherme.
Muito bom o texto. É sempre fundamental evitar o maniqueísmo. Mas o Minc já está "premiando" os estados que mais desmataram a Amazônia, não é? Ou não é bem assim? Assisti na Cultura, sexta-feira, que Maggi teria recebido mais incentivos para a preservação, resta saber do quê: da Amazônia ou dos seus interesses.
Gostaria muito de saber sua opinião sobre o Mangabeira Unger coordenando o PAS.
Um abraço.

Unknown disse...

Oi Cibele,
parece que há muito interesse graúdo envolvido na questão. Quanto mais os jornais fecham o foco em picuinhas entre governadores e governo federal, mais fica explícito que ninguém quer de fato debater o problema. Onde estão, nessas horas, congressistas da região amazônica, como Arthur Virgílio (PSDB-AM)?
Outra coisa que não entendo é essa campanha gratuita e tola contra Minc, desencadeada pela mídia impressa. Parece que ele criou muitos inimigos por lá, em algum momento da vida.
Não gosto da figura nem das idéias de Mangabeira Unger. Depois de se associar ao "governo mais corrupto da história", ele perdeu toda credibilidade. Lula entregou-lhe o PAS para mantê-lo ocupado e porque os lobbies ambientais atuavam para obstruir obras de infraestrutura na Amazônia. Um mediador "neutro" tentaria apaziguar os ânimos de desenvolvimentistas e preservacionistas. A tese é boa. Vamos ver no que vai dar.
Abraços do
Guilherme

Celia Regina disse...

Puxa!
É uma visão maquineísta, você "olhar" esse governo como mais corrupto da históri. Afinal escândalos de corrupção é o que não faltou ao longo da história, passada e recente deste país.