Outra iniciativa reformista foi abortada no Congresso, demonstrando que modificações sérias das estruturas político-eleitorais brasileiras precisam ser empreendidas por assembléias eleitas para esse fim ou por comissões excepcionais com legitimidade longamente construída nas próprias Casas e junto à sociedade. Só ingênuos acreditam que os parlamentares abraçariam regras que tolham seus benefícios, numa tramitação apressada e cheia de pendências, apenas para satisfazer surtos moralistas que, todos sabem, escondem interesses pouco nobres.
A fritura sistemática e quase generalizada do projeto revela o que ele tinha de positivo. Seus inimigos pertencem a três grupos distintos, mas interligados: congressistas de partidos de menor expressão ou legendas de pouca identidade programática (três quartos dos plenários); o jornalismo oposicionista; e o PSDB. Cada facção ilustra os benefícios que a reforma traria.
O voto em lista reforçaria a identidade partidária, fazendo das agremiações os verdadeiros fóruns de debate político. Também coibiria as legendas de aluguel, minando candidaturas personalistas e corporativistas, calcadas em popularidade individual ou lobbies empresariais.
Sem contar o trunfo simbólico, falso ou não, que seria identificado ao governo Lula, uma transformação dessa monta levara também ao fortalecimento do PT, encaminhando o espectro partidário a um enxugamento radical. Isso acarretaria, em médio prazo, uma inevitável alternância regional de poder – e há lugares onde essa possibilidade não é aceita pelos atuais mandatários (o Estado de São Paulo, por exemplo). Ademais, a simples possibilidade de um Congresso Nacional com maioria progressista é tida como pesadelo inaceitável.
Já o PSDB (e seu gêmeo DEM-PFL) se veria apartado da arrecadação privada para campanhas eleitorais. Basta analisar as ramificações do escândalo envolvendo a empreiteira Camargo Corrêa, Fiesp e congêneres, para se ter uma noção vaga do alcance desse problema. O financiamento público nivelaria as chances iniciais dos candidatos de todas as extrações sociais, e de todas as representações políticas. E o controle sobre os gastos ficaria concentrado nos partidos, facilitando a fiscalização e a responsabilização dos abusos. Transparência é boa no bolso dos outros.
Nada disso significa que a reforma seria uma panacéia absoluta ou inviolável. Mas a forma como foi gradativamente aniquilada, principalmente pela imprensa paulista, revela muito dos interesses que contrariou – e dos limites desse discurso ético desferido contra um Congresso que, no fundo, no fundo, ninguém quer mudar tanto assim.
Um comentário:
É isso mesmo.
Indiquei o texto.
Postar um comentário