segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

CSI Paulicéia



Quando um pobre-diabo anônimo sofre assalto, latrocínio e afins, a polícia faz o que pode: registra, pendura e depois arquiva. Sem denúncia ou flagrante, é quase impossível esclarecer um crime desses numa cidade como São Paulo. E nem sempre por culpa das corporações. Simplesmente não há a tecnologia, o contingente e a estrutura necessários para encontrar alguém nos confins da metrópole, apenas através de um retrato-falado, por exemplo.

Já quando a vítima é famosa, como o ex-árbitro Oscar Roberto Godói, e provoca a mobilização da imprensa, rapidinho aparece um suspeito. Em minutos desenha-se um rosto, escaneia-se a figura num equipamento de última geração, um diagrama facial giratório aparece na tela, quadriculado e pontilhado de luzinhas piscantes, enquanto o sistema procura nos infinitos arquivos de fisionomias, digitais e timbres de voz que existem nas centrais da inteligência nacional. Depois de alguma hesitação (afinal, é uma base de dados com duzentos milhões de arquivos), o supercomputador identifica o cenho. Descobre o nome completo e a ficha médica do suspeito, além do endereço de sua amada mãezinha, que ele não deixa de procurar quando está em apuros.

No dia seguinte, eis que os bravos soldados trazem o meliante. Não dá para ter certeza de que ele se parece com o retrato, pois aquele tombo no chuveiro deu uma estragadinha na sua fachada, mas, vá lá, passa. Meio grogue (esse crack é mesmo um problema), o indivíduo assume publicamente a culpa de tudo. Caso encerrado. Depois o coitado vai pegar uma gripe daquelas no xilindró e talvez venha a falecer, mas uma coisa não tem nada a ver com a outra. Afinal, com aquela ficha imensa, quem dá bola pro mané?

Não sei o que chega a ser mais insultante: se o desleixo das autoridades em conferir a mínima verossimilhança a essa comédia ridícula ou se os esforços da sociedade para parecer crédula e satisfeita com tais absurdos.

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