segunda-feira, 11 de abril de 2011

E se Bolsonaro defendesse a pedofilia?



Capa criada por Bob Seidemann para o álbum “Blind Faith” (1969), da banda homônima.

Há duas distorções nos argumentos dos defensores de Jair Bolsonaro: uma visa proteger seu mandato; outra, a sua primariedade penal. Nenhuma delas tem a menor solidez. E ambas são terrivelmente hipócritas.

Durante o mandato, em manifestações públicas, um deputado federal jamais fala como “cidadão comum”. Ele representa o Congresso Nacional e, numa extensão simbólica, as próprias instituições democráticas do país. A imunidade parlamentar impõe responsabilidades que não se restringem ao ambiente do plenário. Caso contrário, o tal “decoro” ficaria restrito a etiquetas cerimoniais. Bolsonaro não usou sua baba retrógrada para discutir leis ou políticas públicas. Ofendendo as coletividades que odeia, ele insultou princípios constitucionais que é pago para preservar.

Ninguém defende o cerceamento da liberdade de expressão do imbecil. Tanto que ele pôde externar publicamente seu pensamento excrementício. Mas agora deve responder pelo gesto de expô-lo, daquela forma e naquelas circunstâncias. É sempre útil reafirmar que o pronunciamento racista e homofóbico do deputado não surgiu num contexto fictício, dramático, especulativo ou mesmo irônico. Ele tampouco foi flagrado numa conversa particular. Em pleno acirramento dos crimes motivados por raça e sexualidade, a fala do deputado ganha característica de incitação à delinqüência.

A hipocrisia dos defensores de Bolsonaro sobressai nas comparações com outros episódios que também precisaram de uma boa dose de ponderação e espírito democrático. Quando cassaram José Dirceu, não houve na imprensa corporativa quem o defendesse com base na sua representatividade ou na separação dos atos de ministro, parlamentar e líder partidário. O mesmo silêncio envolveu a absurda decisão de proibir a Marcha da Maconha em certas localidades, mesmo que os inúmeros argumentos favoráveis à legalização destruam a autoritária tese da “apologia ao crime”.

Caso Bolsonaro não tivesse atingido os negros ou os homossexuais, as reações da mídia conservadora seriam menos “tolerantes”. As boas famílias ficariam indignadas se ele dissesse, por exemplo, “tem umas garotinhas por aí, de onze, doze anos, que são umas delícias.” Notem que esta hipótese também expressaria um juízo individual. Mas será que alguém viria defendê-lo, ponderando que existe uma “pedofilia do bem”?

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