A armadilha é condenar a obra por não tomar
posição militante contra a tortura, como se qualquer artista fosse obrigado a
inserir subtextos didáticos e rostinhos chocados para mostrar o que pensa, ou,
pior, o que a platéia deve pensar.
Mas existem ponderações necessárias. O filme se
coloca num meio-termo entre o ficcional e o informativo, aproveitando as
estratégias narrativas de ambos os registros. Permeando clichês de gênero e
especulações factuais sobre o suposto assassinato de Osama bin Laden,
estabelece um discurso levemente autoritário, já que não pode ser questionado:
a farsa justifica os deslizes da reportagem e vice-versa.
O torturador com boas intenções, a espiã bonita e
aplicada, os soldados simpáticos e competentes, o patriotismo, a vitimização e
até a natureza das torturas fazem parte do mesmo pacote de verossimilhança e
empatia. Jane Mayer apontou com precisão que essa estratégia carrega falácias tão
graves sobre as técnicas de interrogatório aplicadas pelos EUA que o filme
acaba concedendo-lhes um tratamento quase apologético.
Não ajuda, portanto, vender o filme apenas como
entretenimento ligeiro, ou sequer como reflexão geopolítica distanciada. Seu
tom propagandístico é tão evidente quanto seria o de um longa “expositivo” detalhando
os bastidores do 11/9, cujos personagens árabes, sagazes e intrépidos,
justificassem a vingança lembrando os “milhares de civis inocentes” mortos pelos EUA.
Tudo isso posto, é produção desigual. Primeira
metade longa demais, explicações insuficientes, um clímax abrupto. Personagens
frouxos, apesar do elenco célebre. E algumas qualidades técnicas (especialmente
a montagem) que apenas confirmam o talento de Kathryn Bigelow para tramas de
ação.
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