Muitas camadas de sentidos se sobrepõem no enredo de aparência
simples: ressentimentos de classe, violência urbana, culpas, egoísmo, vazio
existencial, heranças de exploração coronelista, metáforas diversas. Estréia promissora de Kleber Mendonça Filho. Gosto de saber que ele vem de uma atividade profissional ligada à cinefilia, não-acadêmica, e nem por isso deixa de orquestrar o ritmo, a ambientação e a narrativa com notável habilidade.
Sutil, contemplativo, delicadamente irônico e
sensual. A reunião de condôminos e o desfecho anticlimático e alusivo são
momentos especiais. A gradativa apropriação do espaço público pelos seguranças
é construída numa engenhosa naturalidade, feito raro nas abordagens cinematográficas
de temas atuais e complexos.
Há algo estranho na recepção festiva de certos
críticos. Buscando um distanciamento intelectualizado cheio de implicações
questionáveis, parecem evitar o corrosivo retrato que o filme propõe dos
personagens abonados, insensíveis, rancorosos, paternalistas, entristecidos.
Talvez porque se vejam refletidos ali. Talvez ainda porque é mais cômodo fugir
para um espaço analítico pretensamente neutro, no qual a erudição substitui a
autocrítica.
Não é de hoje que os cineastas pernambucanos
formam uma vanguarda sem equivalentes no resto do país.
Nenhum comentário:
Postar um comentário