terça-feira, 6 de agosto de 2013

A estratégia do transtorno














É necessário questionar certos discursos, tidos como “progressistas”, que se apressam em justificar as conseqüências negativas de qualquer manifestação pública. Segundo eles, a atribulação dá visibilidade a setores e pautas historicamente menosprezados, arrancando os acomodados da letargia egoísta, os governantes do conforto insensível, a mídia do silêncio conivente. Não há transformação coletiva, afirmam, sem sacrifícios individuais.

Concordo. Mas também me parece que o foco de alguns protestos passou a incidir mais nos danos infringidos à população do que nos constrangimentos possíveis aos detentores de cargos públicos. Embora exista óbvia força persuasiva na paralisação caótica da metrópole, é difícil enxergar o mesmo resultado em outros bloqueios da mobilidade geral. Estradas e aeroportos, por exemplo.

Em tempos de radicalismos generalizados, sempre há espaço para a tola demonização do transporte particular, e mesmo para a estratégia de disseminar prejuízos e tormentos sem exigências viáveis ou abertura de canais de negociação. Mas o que esses equívocos materializam, em termos de conquistas sociais práticas, é nulo.

Táticas inconseqüentes revelam pautas vazias. Apenas o radicalismo obtuso se satisfaz com o transtorno pelo transtorno. Sua motivação é a simples capacidade de causar problemas e receber eventual cobertura noticiosa. Ele não precisa de grandes mobilizações, pois uma centena de malucos incendiando lixo pode fechar qualquer rodovia. Não precisa, portanto, de representatividade.

Além da perigosa pauta genérica, os novos protestos começaram a embutir uma idéia de naturalização do efeito colateral nocivo, que de trivial passa a frustrante e assim precisa se tornar cada vez mais acirrado e gratuito. O pretexto de “vingar” o sofrimento físico das populações carentes cria um círculo vicioso absurdo, que perpetua a barbárie em vez de combatê-la. A violência policial vira resultado inevitável das manifestações, contraditoriamente alimentadas pela própria ação repressiva que orgulhosamente provocam.

Há algo muito errado num espírito reivindicatório que se planeja com a presunção do conflito e do prejuízo, em detrimento de verdadeiras conquistas democráticas.

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