É difícil abordar os xingamentos a Dilma Rousseff sem
repetir as condenações ao espírito jeca e boçal de certas castas privilegiadas
cujo padrão ético se baseia no esculacho e na patifaria. Causa algum incômodo,
porém, o reiterado esforço para despolitizar a atitude, como se ela fosse vazia
de intencionalidades e cargas simbólicas.
Toda ação pública possui sentidos políticos, e ofender
uma autoridade governamental revela um posicionamento ideológico indiscutível. Não
apenas pela iniciativa de repúdio, pois o vocabulário, o contexto, a ocasião e
a vítima seguem escolhas militantes cheias de significados. Então por que os
comentaristas procuram ignorar esses sinais?
Na superfície notamos o receio de vitimização da
presidenta, aliado à vergonha diante do repertório intelectual oposicionista.
Mas arrisco sugerir que também existe aí o temor inconfesso de que o grau de
organização das brutalidades ultrapasse a utopia conveniente de um gesto
espontâneo dos grupos ignóbeis. A eventual descoberta de que o ritual grotesco
nasceu numa articulação do submundo partidário é bastante assustadora para que
ninguém se aventure a sequer especulá-la.
Mas, claro, se a turma exigisse, durante uma
cerimônia importante, a sodomia de Geraldo Alckmin ou Aécio Neves, o jornalismo
civilizado já teria descoberto mil e uma conspirações. Até mesmo as plausíveis.
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