A mídia trata as suas deturpações contra a Copa do
Mundo brasileira como acidentes de percurso, retratos momentâneos de uma
espécie de alucinação coletiva pessimista que teria levado toda a sociedade ao
engano. Mais uma vez, a imprensa se esforça para jogar as patranhas na conta da
famosa “opinião pública”.
A ingenuidade não serve de álibi para o jornalismo
profissional. Através de um trabalho rudimentar de apuração e de um tratamento
cuidadoso da boataria anti-Copa, os veículos teriam evitado boa parte das bobagens
que mancharam a cobertura do torneio. Principalmente as publicações
estrangeiras, que embarcaram na onda alimentada pelos equivalentes locais e
passaram vergonha junto com eles.
A revista alemã Sipegel cometeu uma capa assustadora,
com o título “Morte e jogos”. O texto, de Jens Glüsing, fazia previsões
sombrias de "protestos e greves, problemas com infraestrutura e
violência". Correspondente anônimo da Economist anunciou um colapso nos
transportes brasileiros, e foi seguido por Jonathan Wheatley, do Financial Times. Certo Patrick Hill assinou matéria hilariante para o The Daily Mirror, cujo
título dispensa comentários: “Manaus assassina: torcedores ingleses enfrentarão
partida da Copa do Mundo num dos lugares mais perigosos do planeta”.
É bem verdade que as fontes não ajudaram. O
presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Augusto Nardes, por
exemplo, bradou que o Brasil iria “passar vergonha” na Copa. O CEO da Avianca, José
Efromovich, disse ao The Wall Street Journal que os problemas com vôos eram
inevitáveis. O aeroporto de Fortaleza não teria condições de receber metade dos
torcedores para a partida Brasil x México. E Ronaldo confessou-se envergonhado,
para delírio dos fãs.
Mas foi nas colunas de opinião que a futurologia irresponsável
atingiu o ápice. José Cruz (UOL) escreveu em janeiro que a Copa teria “repercussão
internacional desastrosa” e representaria “um pesadelo”, “uma bomba”. Editorial do Estadão ponderou que seria “de bom tamanho se o Brasil não protagonizar um
vexame sem precedentes na história das Copas”. Juca Kfouri (Folha) via “atrasos
irrecuperáveis” e um prejuízo “vergonhoso” para a imagem do país.
Também na Folha, Eliane Cantanhêde levantou
suspeitas generalizadas de corrupção em torno das melhorias destinadas à Copa.
Depois chamou a situação de “preocupante”, denunciando investimentos “poucos e
mal utilizados”, obras “a passos de tartaruga”, falta de compromisso “com
prazos, com o usuário brasileiro, com as levas de turistas.” Arnaldo Jabor
(CBN) vaticinou que o torneio iria “revelar ao mundo a nossa incompetência”. E
Marília Ruiz (Terra), perguntava, indignada: “sete anos para fazer essa Copinha
do Mundo? (...) Vai ser um vexame. Um ve-xa-me”.
Apesar de todos os equívocos, não houve uma linha
explicando-os. Nenhum repórter se deu ao trabalho de inquirir novamente os
antigos profetas do apocalipse acerca de suas antecipações macabras. Os geniais
comentaristas deram de ombros, como se tivessem apenas cumprido obrigações
funcionais, isentos e rigorosos que são.
Essa turma agora retorna fazendo ponderações
equilibradas sobre a Copa, inventando um lugar digno para aqueles que tentaram
sabotá-la. Os pimpões torcem para que, daqui a dois anos, tenhamos esquecido os
prejuízos causados por suas mentiras. Não será tão fácil.
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