terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

As perspectivas de Lula



O TRF-4 inviabilizou a candidatura oficial de Lula, seja qual for a etapa da impugnação. A lei da Ficha Limpa e a falta de jurisprudência específica facilitam a decisão do TSE, que já teria viés negativo mesmo sem esse respaldo. Os trâmites devem postergar, mas dificilmente impedirão algo que norteou toda a estrutura inquisitória da Lava Jato.

Acontece que Lula possui um poder de influência que exorbita as prerrogativas do TSE. A cúpula do Judiciário conhece o valor estratégico da mobilização em torno do petista e adivinha o significado perigoso de tê-lo solto, fazendo grandes comícios, denunciando os justiceiros, alimentando a expectativa dos eleitores.

Apesar do relativo apoio no STF, o pedido de habeas corpus carrega desdobramentos que poriam em cheque a própria essência ideológica da condenação. Eis o limite do teatro republicano da corte, inclusive entre os quadros garantistas: o corporativismo judicial prefere criar um mártir sob controle a permitir que o exercício de direitos constitucionais descambe para a apologia da desobediência.

Essa gangorra de prerrogativas negadas e concedidas faz parte dos planos da Lava Jato. A iminência da cadeia serve de blindagem para a cassação da candidatura, garantindo que esta seja vista como um “mal menor” e forçando Lula à humilhação de aceitá-la sem resistência. Não que lhe restem muitas alternativas, mas nenhuma delas inclui desafiar a imagem soberana do Judiciário.

É razoável imaginar que Sepúlveda Pertence proponha a Lula uma atitude apaziguadora em troca da boa vontade do STF. E a hipótese de abstenções no julgamento do habeas corpus pode mesmo significar um aceno de contrapartida à moderação do ex-presidente. Remédio incerto, quiçá fugaz, mas ainda assim preferível ao encarceramento, numa data forte como 21 de abril ou 1º de maio, com requintes de humilhação pública.

Em breve constataremos a estratégia adotada. Mas pragmatismo e confronto afluem para a admissão de que a candidatura Lula ruiu, seja como afago à sanha punitiva da Lava Jato, seja como resultado lógico da sua materialização. Resta saber de que maneira o petista administrará o imenso legado político que o cerco judicial tenta neutralizar.

Persistindo a postura hostil às cortes, negar a perspectiva da prisão de Lula seria uma forma de contribuir com o esforço em legitimá-la sob a falácia da imprevisibilidade. Canalizando as atenções para um suspense farsesco, o marco simbólico preparado pela mídia naturalizaria o infame acórdão do TRF-4. O foco do lulismo precisaria se ater mais à escandalosa iminência do fato que à expectativa de impedi-lo.

A opção conciliadora também pede cuidados. Lula teria o desafio de equilibrar sua luta nos tribunais e as articulações sucessórias, combatendo a ameaça conservadora sem dar pretextos para a hidrofobia vingativa do STF. Um eventual habeas corpus resultaria positivo para a imagem do ex-presidente, inclusive na sua esperança de absolvição, mas não tardaria a suscitar reações fortes do antipetismo judicial.

Um comentário:

Anônimo disse...

Seus textos são brilhantes!! Os saboreio com a máxima voracidade q posso.