sexta-feira, 25 de abril de 2008

Guerra na rede

(publicado no Observatório da Imprensa com o título "A hegemonia da crítica conservadora")

A radicalização ideológica das grandes empresas jornalísticas teve duas motivações complementares. Primeiro, foi um gesto espontâneo de afinidade partidária: a eleição de Lula contrariou os desejos pessoais (e os prognósticos) da maioria das cúpulas editoriais, que defendiam, aberta ou veladamente, os governos FHC. Mas houve também uma crise financeira sem precedentes no mercado da informação, que forçou os veículos a adotarem um aberto posicionamento político para atrair consumidores fiéis.
O conservadorismo tornou-se hegemônico não apenas por escolha voluntária das redações, mas principalmente por sua associação ao repertório de valores dominante em certo público-alvo. Só que esse método fracassou como indutor eleitoral. Mesmo descontando-se a maioria sem acesso à mídia escrita, uma análise dos resultados do segundo turno das últimas eleições revela que os veículos não conseguiram convencer seus próprios seguidores, das parcelas mais escolarizadas da sociedade.

Revolta nas redações – Para se ter idéia da gravidade dessa constatação, basta lembrar quantas vezes, nos últimos cinqüenta anos, a imprensa abalou governos, inclusive derrubando presidentes, apenas através de seu poder mobilizador.
Tamanha desmoralização dos meios informativos tradicionais é um marco revolucionário da recente história jornalística nacional. Ela originou o profundo sentimento de frustração e revanchismo que se percebe nas entrelinhas dos artigos, nas entonações dos pronunciamentos, no calor dos debates e, finalmente, nos ataques desferidos pelos comentaristas contra os blogues da internet.
Nomes consagrados do periodismo têm destilado torrentes venenosas contra os blogueiros, chegando a constrangedores extremos de agressividade. Acusam fanatismo, grosseria e até canalhice, ameaçam represálias e defendem legislações repressivas. Vingam-se, assim, da aparente traição eleitoral de 2006: transformaram os dissidentes das classes média e alta em turba animalesca de parasitas anônimos.

Militância eletrônica – Desnecessário insistir que a luta é inglória. Os blogueiros apenas realizam as potencialidades da liberdade de expressão, que lhes são vedadas na grande imprensa. Compõem uma verdadeira população de militantes e analistas amadores que usam a mídia eletrônica para resgatar a multiplicidade de opiniões e a controvérsia desaparecidas de outros meios. E não restam dúvidas de que são bem-sucedidos nessa empreitada.
Os autores dos blogues não representam ameaça à coletividade. Como qualquer jornalista profissional, estão submetidos a sanções legais; uma assinatura genérica tipo “Da redação” também protege a identidade do autor, mas tampouco lhe serve como couraça inescrutável. Debates sérios sobre calúnias e anonimatos abarcariam os limites da especulação noticiosa, da palpitaria irresponsável e do sigilo de fontes viciadas – que de forma alguma são exclusividades da chamada “blogosfera”.
A reação dos comentaristas esconde a soberba do orgulho corporativo ferido. “Especialistas”, não admitem ser contrariados por ignaros. Precisam parecer superiores ao povaréu blogueiro, como se um contrato de trabalho (ou, pior, o diploma) lhes conferisse status de infalibilidade. É a versão arrogante do “discurso competente”, sutil autoritarismo travestido de imparcialidade técnica.
Os blogues estão a salvo de ingerências hierárquicas, econômicas e institucionais, expondo o ridículo da dissimulação pretensamente oficiosa dos grandes veículos. E ensinando que as liberdades só adquirem verdadeira função democrática quando se tornam incômodas.

2 comentários:

Anônimo disse...

guilherme,
achei muito interessante o texto,
"eles", são os do "público-alvo", remetendo a direcionalidade, pessoalidade e passividade. Não sabem mais se atingem o alvo, pois a sua mira já é caduca tanto quanto o foco, e o público, somos nós, os os participantes que gostamos de construir a troca de idéias livremente.

Me desculpe o Anônimo, pois não tenho conta no google,
sR_OceanoAzul

Alberto disse...

Muitos jornalistas, principalmente alguns cardeais, usaram e abusaram da expressão mudança. A usaram para comentar sobre a internet. E não foram capazes de entender as ferramentas que ela fornece. E ainda bem. O mundo virtual permite que se possa buscar, rapidamente, novas fontes de informação. Na rede, temos a pluralidade. Lamento a arrogância de muitos, que no passado eu lia com maior respeito.