A Lei nº. 11105/2005, que permite a pesquisa com células-tronco, é restritiva e atrasada em relação às similares vigentes em outros países. Ela representa um gesto acanhado do Congresso Nacional, cujo notório conservadorismo foi vencido a custo por lobbies mais ou menos confessáveis.
Tribunais não legislam. O STF só encenou sua pantomima porque foi consultado para determinar a constitucionalidade da lei. As intermináveis ponderações normativas e os atrasos regimentais deram aspecto revolucionário a uma decisão que, em tese, já havia sido escrutinada por esferas competentes do Legislativo. Esse espetáculo um tanto soberbo do Tribunal reitera seu apego pelo vício “legislatório”, que contamina certos debates de vasto apelo midiático. Numa situação de completo desapego ideológico e ausência de vaidades, o julgamento seria rápido, desinteressante e previsível.
As pressões do fundamentalismo cristão revelam quão distantes as instituições religiosas encontram-se da realidade histórica, e o grau de malefício coletivo que estão dispostas a provocar para impor seus dogmas. O apoio recebido por elas de setores importantes da sociedade, inclusive magistrados e congressistas, demonstra uma preocupante força mobilizadora do espírito retrógrado.
A manipulação de embriões permanece uma abstração científica, ainda subjetiva e de resultados incertos. Há outros temas fundamentais e urgentes escondidos sob a polêmica. O mais imediato é a criminalização do aborto, baseada na tese de que a concepção origina um ser humano completo, independentemente do estágio celular. No campo simbólico desenvolve-se um conflito entre fé e ciência para determinar que esfera deve prevalecer em decisões envolvendo o corpo e a saúde, a intimidade e o livre-arbítrio – e que atingem, no limite, sexo, drogas, casamento, homossexualidade e outros tabus.
Em nível macro-histórico, as pressões do atraso são desimportantes, porque fadadas ao limbo. As liberdades individuais e o progresso científico estão no cerne da tumultuosa e dramática evolução humana. Eventuais ondas retroativas sempre originam, inevitavelmente, avanços ainda maiores. A luta possível (e necessária) é para viabilizá-los enquanto parecem utópicos.
A dificuldade de superar certos paradigmas ultrapassados talvez ilumine um novo caminho para a militância político-partidária, calcada em programas ainda menosprezados pelas cartilhas ortodoxas. As esquerdas tradicionais têm muito a aprender em tais circunstâncias.
Um comentário:
Guilherme, parabenizo pelos belos comentários, aliás, são publicados no blog Desabafo País.
Muito bom matéria sobre a demissão de Marina Silva. Um forte abraço, Daniel.
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