O governo estadunidense continua utilizando dinheiro público para recuperar as instituições particulares que protagonizaram a crise financeira em curso. Já questionei, na época das primeiras intervenções, as aparentes contradições da cartilha neoliberal – no fundo, muito coerentes com seus princípios básicos.
O Estado salvacionista só é execrado pelo capitalismo predatório quando tenta aplicar políticas compensatórias para miseráveis e pobres. Salvar banqueiros e especuladores falidos deixa de ser assistencialismo e torna-se responsabilidade governamental. Afinal, crianças famintas não acarretam qualquer “risco sistêmico”.
Parece divertido assistir à administração Bush cometer seus pecados estatizantes em pleno século 21. Se há algo que diferencia republicanos e democratas, é a importância mínima conferida pelos primeiros ao papel do Estado, principalmente em questões sociais e econômicas. E Bush venceu com uma plataforma explícita de não-intervencionismo (assim como a alemã Merkel e o francês Sarkozy, que agora também relativizam suas posições).
A sombra de 1929 tem sido superdimensionada. Em qualquer cenário pré-11/9, o Congresso dos EUA deixaria os burocratas falando sozinhos, com ratoeiras nos bolsos. Um punhado de magnatas antropófagos compraria as empresas falidas para revendê-las em pedaços, como ocorreu tantas vezes. E os winners continuariam zombando dos losers que não sabem lidar com a bufunfa.
Acontece que hoje os EUA estão divididos numa campanha presidencial de forte carga simbólica e resultados imprevisíveis. O pacote intervencionista de Bush é pura manobra eleitoreira, paliativo para evitar a catástrofe republicana, a dois meses da votação. Pode parecer um gesto desesperado, e em parte é. Mas, como sempre, suas verdadeiras motivações escondem-se muito além (e através) do catastrofismo econômico.
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