segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

O vazio

Publicado na página do Le Monde Diplomatique

Em agosto de 2005, durante uma reunião com o reitor e diretores da Unesp de Franca (SP), alguns estudantes realizaram um protesto inusitado: um rapaz defecou numa folha de jornal, outro vomitou num balde e os demais sacaram coquetéis Molotov. Diante da previsível retaliação da universidade, os manifestantes reagiram indignados, apresentando-se como coletivo de artistas que havia organizado uma espécie de happening político, embasado nas teorias dos dadaístas e de Marcel Duchamp.
Episódios similares conferem argumentos a vertentes conservadoras da crítica, que responsabilizam o legado iconoclasta das vanguardas do século passado por certa indulgência que contaminaria as artes contemporâneas. O exibicionismo dos criadores, a consagração de obras destituídas de valores estéticos e a conseqüente alienação do público seriam manifestações de uma crise intrínseca à pós-modernidade, nascida na afirmação genérica e gratuita do estatuto artístico.
Essa abordagem, problemática e obsoleta, reproduz o autoritarismo denunciado na agressividade inconseqüente de alguns “artistas” (e a justifica, por reação). A pretensão à infalibilidade analítica é comum a todo fundamentalismo de essência solipsista – o juízo individual (meu, de preferência) está sempre correto.
A 28ª Bienal de São Paulo representa um híbrido simbólico dos universitários porcalhões e de seus inimigos puristas. Os curadores transformaram um dos maiores eventos de arte contemporânea do planeta num gigantesco prédio desocupado, salvo por objetos e atividades esparsos. Enfeitaram a iniciativa com bricabraques retóricos, conferindo-lhe significados profundos e respeitáveis. Ao mesmo tempo, apesar da interatividade professada, criaram uma blindagem institucional (e policial) para coibir manifestações alienígenas. Sacralizaram o nada (leia aqui o texto integral).

2 comentários:

Guilhermé disse...

Para quem interessar, rolou uma discussão interessante sobre a questão da bienal na paulicéia no blog Manual Prático de Delinqüência Juvenil, vale dar uma olhada lá -http://www.delinquente.blogger.com.br/

Abraços.

Anônimo disse...

http://www.culturaemercado.com.br/post/pela-degola-dos-cartolas-da-cultura/
Vale a leitura