segunda-feira, 6 de abril de 2009

Guga e Pelé

Ambos destacaram-se em modalidades absolutamente diversas, são personalidades inconciliáveis e construíram carreiras, relacionamentos e sociedades comerciais quase opostos. Soa impossível compará-los, e é por isso que o desafio atrai.
Pelé é mais popular, mas Guga parece ter amealhado (ou preservado) maior fortuna. A carreira do primeiro durou mais e desenvolveu-se em parte sob condições precárias, sem os rigores, o profissionalismo e a tecnologia atuais, particularmente do tênis de primeira linha. Guga não teve origens humildes e triunfou num ambiente livre dos interesses obscuros do futebol, que estraçalha talentos e inventa heróis artificiais.
Numa análise leiga sobre a capacidade atlética e os feitos esportivos de cada um, Guga sobressai. Jogava sozinho, em permanente estado de concentração e exigência física, com desgaste inigualável: partidas de três, quatro horas ininterruptas, em dias seguidos. Cada torneio que o tenista venceu significou uma seqüência de vitórias decisivas, às vezes sem descanso entre as competições – todas, aliás, verdadeiros campeonatos mundiais, por incluírem sempre os melhores atletas do momento.
Apesar de sua inegável genialidade, Pelé triunfou necessariamente em conjunto com os outros companheiros de equipe, alguns deles maravilhosos jogadores. Mesmo quando se sagrou campeão, ele pôde ausentar-se total ou parcialmente de jogos, seu desempenho não tinha de ser impecável sempre e até empates (ou mesmo derrotas) eram toleráveis. E um futebolista não corre os noventa minutos nem joga para valer todo dia, embora o contato físico seja um importante diferencial a seu favor.
Há grande esforço midiático, já antigo, para transformar Pelé no “atleta do século”, alçando-o a uma espécie de divindade. Essa propaganda trata os discordantes como hereges e jamais recebeu tratamento suficientemente crítico, ainda precisando ser destrinçada à luz de outros esportes e de jogadores subestimados que não gozaram dos privilégios que Pelé desfrutou.
Talvez fosse um bom pretexto para repensar essa permanente necessidade de auto-afirmação que fez de Pelé o porta-voz de nosso espírito cordial, malandro e fagueiro. Contentamo-nos com a superioridade individual e localizada, em vez de incentivar a disseminação da competência (mesmo que mediana), do exemplo moral, da diversidade.
Esse comportamento pernicioso evidencia e valoriza a enorme, incomparável, contribuição de Guga para o esporte nacional.

7 comentários:

fks disse...

A mitificação de Edson Arantes do Nascimento repercurtiu sobretudo pelo fato de ser negro de um país do terceiro mundo(como se costumava dizer nos anos da Guerra Fria)recriando o esporte dos Nobres Bretões. A heterôgenea e diversa Africa respirou, acolheu e inventou o seu Pelé. O primeiro Afro-Americano pop-star a sacudir os meios de comunicação internacionais com a autenticidade de sua ginga.

fks

Felipe disse...

Dentre os dois como atleta do século, fico com o Senna. Apesar de simpatizar muito com o Guga sou fâ do Senna. Também veio de uma familia abastada e mesmo sendo queridinho da globo (o que acho péssimo), foi uma personalidade marcante, também praticou um esporte que exigia um esforço individual termendo, com horas de concentração, embora na F1 houvesse um intervalo maior entre as competições, o que permitia uma recuperação mais folgada. Teve que enfrentar essa midia esportiva brasileira que não aceita segundo lugar, e era um cara dedicado ao extremo, segundo Nuno Cobra (seu treinador fisico) era um exemplo de preserverança, de luta constante. Treinava como um louco, em condições adversas (na chuva), e era o piloto mais ousado que já vi, partindo pra cima sem medo, com ultrapassagens que eram dribles desconcertantes (coisa que nunca mais vi na F1), além de suas corridas históricas de sair lá atrás e terminar na frente, ultrapassando um por um. Enfim, na minha opinião, Senna foi o atleta do século.

Concordo com você, porque o atleta do século tem que vir do futebol? Se analisarmos os esportes individuais, eles exigem muito mais esforço e dedicação do ser humano e merecem mais respeito!

fks disse...

Também como leigo é importante ressaltar que se joga pelada com bolinha de Tênis, já com bola de capotão...
E carrinhos de rolimã merecem incentivo de esporte profissional.

fks

Guilhermé disse...

Apesar de discordar de alguns pontos, achei muito interessante a comparação. Talvez a discussão não existisse se o Pelé não fosse uma figura de carater e interessantes obscuros.
Enquanto o primeiro foi absorvido pela cultura política viciada do meio q o projetou, o mais novo, prefere refatelar-se em sua fortuna, eximindo-se de posicionar-se sobre qualquer questão relevante.

Alexandre Silva disse...

Pelé é o "atleta do século" no esporte que o consagrou: o futebol. Ele não foi jogador de tênis,vôlei ou corredor de 100 metros rasos. Por isso este título só deveria ser considerado na referida modalidade. Compará-lo com Guga é no mínimo desnecessário. Os dois elevaram o nome do Brasil no esporte. Cada um em na sua praia.

Unknown disse...

Fks, realmente faltou tecer uma análise sobre o importante aspecto simbólico, cultural e até político do sucesso internacional de Pelé. Boa lembrança.
Abraços do
Guilherme

Gustavo Scalzilli disse...

Nem de longe considero automobilismo como esporte para alçar alguém a melhor do Brasil.
Mas acho que se formos pensar na personalidade do Pelé diante do mundo ele é de longe maior do que o Guga. Em qq lugar do planeta sabem e reconhecem o "negão" como atleta, personalidade e exemplo atlético.
Outro ponto a favor de Pelé está no fato dele ter sido o melhor no esporte de maior aceitação global. Ou seja, com maior número de praticantes no mundo. O Guga, que foi brilhante diga-se, foi melhor do mundo durante apenas 1 ano num esporte extremamente elitisado e que possui, talvez, 10% dos praticamentes. Os números de Pelé nunca serão alcançados (pelo visto). Os números de Guga são superados todos os anos.

Talvez as conquistas de Guga sejam maiores. Simplesmente pq nesse país que idolatra somente o Futebol e a F1, ele tenha sido, com forças próprias, o melhor do mundo. O que é simplesmente fantástico. Assim como Aurélio Miguel no judô e tantos outros em esportes muito menos abastados.

Acredito que os feitos realizados por um não podem ser comparados a outro. Porém acredito sim que como ATLETA os feitos que Pelé realizou são maiores mundialmente do que os de Guga.