É impossível estabelecer motivos isolados para tantas chacinas de crianças nos EUA. Há o comércio de armas, evidentemente, mas a incompetência
pedagógica, o desrespeito dos colegas e a insanidade dos próprios matadores não
podem ser desprezados. Acontece que mesmo esses fatores estão presentes em muitos
outros países, sem necessariamente culminar de forma trágica. Que espécie de faísca macabra potencializa as influências negativas e faz dos EUA o campeão mundial de
uma forma tão peculiar de violência doméstica?
A resposta parece cultural, no sentido mais
profundo e nuclear do conceito. Muito além de simplificações acerca do
entretenimento de massas e da apologia da violência, a intelectualidade local e
a administração Barack Obama deveriam refletir sobre a falência da ideia de pertencimento
nacional dos cidadãos. Em outras palavras, sobre a ruína dos símbolos identitários,
coletivamente reconhecidos e respeitados, que forjam um elo mínimo de comunhão
entre indivíduos da mesma comunidade.
Violências estúpidas como a de Newtown não podem
ser dissociadas do campo de concentração de Guantánamo, dos bombardeios de civis
desarmados, do confinamento brutal de um soldado que denunciou violações de
direitos humanos e da tortura de prisioneiros de guerra. A desejada tolerância
da sociedade perante os abusos do governo militarizado é, na verdade, um tipo de
cinismo que se torna cada vez mais ressentido, destrutivo e indiferente à dor humana. Que valores
deveriam nortear a juventude se o próprio governo federal, símbolo do peculiar
patriotismo estadunidense, lhe fornece os piores exemplos?
A imagem de Obama chorando pelas crianças mortas,
depois de autorizar o assassinato de tantas outras pelo planeta, talvez tenha
um efeito bastante imprevisto sobre a audiência.
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