Publicado no Brasil 247
Até aqui, o roteiro do impeachment seguiu a lógica
previsível.
A iniciativa de Eduardo Cunha é consequência da
pressão oportunista que ele sofreu do Judiciário, ávido para atingir
os objetivos políticos da Lava Jato antes que o apuro dos tucanos esvazie a
operação. A esquisita prisão de Delcídio Amaral deixou sinais de que
as cortes já não conseguem lidar com a ansiedade dos bastidores investigativos.
Também o momento de prorrogação da crise obedece ao propósito original de manter o governo acuado, atingindo-o exatamente
quando ele ameaçava recuperar alguma estabilidade. Por isso mesmo, recessos,
“pedidos de vista” ou quaisquer adiamentos no desfecho da questão favorecem
apenas o projeto reacionário.
As passeatas legalistas comprovarão seu papel decisivo no sepultamento do golpe. Nem tanto por causa da suposta
resistência ao fato consumado, mas principalmente por anteciparem a força
oposicionista que um novo governo enfrentaria. Esse aspecto será decisivo para
o posicionamento do empresariado e do campo jurídico no embate.
O governismo agora precisa de união e iniciativa.
Ambas se conquistam superando as desavenças com certa esquerda reticente e assumindo sem hesitações o pólo republicano da disputa. A mídia tentará
descolar Cunha do processo para anular o antagonismo ético em jogo. Eis o ponto
central da narrativa do impeachment.
Daí a importância de o Planalto não cair na
armadilha de transformar Michel Temer em adversário direto. Ele é o
representante ideal que o golpismo procura. Ao mesmo tempo, suas conspirações
têm apelo restrito. O vice pode barganhar apenas um futuro incerto de
crise e conturbação social. Dilma guarda poder efetivo, de materialização
imediata.
Isso nos conduz ao fato de que a luta será
decidida no Congresso Nacional. Ali não funciona brandir méritos jurídicos ou
minúcias técnicas. A pressão sobre os parlamentares deve atingir os respectivos
interesses nas eleições do ano que vem. Os candidatos e seus financiadores não
querem passar 2016 justificando exonerações de correligionários e o apoio à
chantagem de um notório contraventor.
Sabendo colocar-se como adversária da
irresponsabilidade e da sordidez política, Dilma conseguirá ao menos preservar o
cargo. Mas esta seria uma vitória frustrante, quase nula em médio prazo, se o governo
continuar fraco e isolado. A luta abrange a preservação da agenda progressista
endossada pelas urnas. O que temos adiante é o desfecho da campanha eleitoral
mais longa e ruinosa de nossa história republicana.
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