Publicado no Brasil 247
Quem acredita que os protestos foram surtos espontâneos de revolta desconhece a árdua rotina das mobilizações populares no país. Se as redes sociais bastassem para sublevar descontentes, as capitais paralisariam todo fim de semana. Reivindicações não faltam. O que falta é o apoio da imprensa corporativa a elas.
Quem acredita que os protestos foram surtos espontâneos de revolta desconhece a árdua rotina das mobilizações populares no país. Se as redes sociais bastassem para sublevar descontentes, as capitais paralisariam todo fim de semana. Reivindicações não faltam. O que falta é o apoio da imprensa corporativa a elas.
Trabalhos acadêmicos futuros mostrarão como o
fenômeno de 15 de março de 2015 foi construído pelos grandes veículos. Ao longo
das três semanas anteriores, canais de TV, emissoras de rádio, jornais,
revistas e portais da internet uniram-se na divulgação do evento, associada a
noticiário negativo sobre o governo federal.
Esse fabuloso esforço propagandístico deu
visibilidade heroica a grupelhos irrelevantes da direita, que há
poucos meses faziam passeatas minguadas e caricatas. Disseminou a imagem
republicana dos atos, atraindo os adeptos das modas protestantes de 2013. E naturalizou ideologicamente o antipetismo no repertório moralista da classe
média.
Desde a preparação do golpe militar de 1964, a
imprensa brasileira não agia de maneira tão uníssona e articulada. Nas TVs e
rádios, houve menções contínuas em todos os espaços de programação, incluindo
chamadas sensacionalistas para coberturas ao vivo. Até astros e celebridades
foram mobilizados. Nos meios impressos, primeiras páginas, colunas e
reportagens dedicaram-se diariamente ao tema.
O recado que as empresas de comunicação transmitem
ao governo federal é inequívoco: “eis o que podemos fazer contra nossos inimigos”.
O gesto adquire oportunismo diante dos debates envolvendo o Marco Regulatório do setor, a reforma política e a taxação de grandes
fortunas. E agora ganha ainda mais sentido com a descoberta do envolvimento de chefetes midiáticos na lista de contas no HSBC suíço.
Tendo em vista o porte do empreendimento,
mobilizar 1% do eleitorado nacional chega a soar um tanto irrisório. Mesmo
entre os 51 milhões de eleitores de Aécio Neves, uma fração mínima saiu às
ruas. Claro que, na condição de promotora do espetáculo, a imprensa vai
exagerar seus resultados, conferindo grandiosidades inéditas ao feito, sem
esmiuçar os outros detalhes que também o tornaram único na história recente.
Mas é a simbologia do episódio que deveria
preocupar o governo Dilma Rousseff. Repetindo março de 64 (e a coincidência nas
datas não é casual), os agressores querem evitar que o Planalto supere a crise
política através de medidas radicais que aglutinem as bases populares. Basta um
leve sinal nesse sentido e a mídia joga o “apelo das ruas” sobre o Congresso,
na forma do impeachment.
A mensagem é muito clara e preocupante para
receber apenas discursos apaziguadores e promessas vazias. A não ser que Dilma
tenha desistido de enfrentar seus adversários.
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